Mercado imobiliário desacelerou menos do que o esperado
Havia expectativa de desaquecimento mais acentuado como reflexo do período eleitoral e dos juros mais altos
Por Redação Em:
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Por Chiara Quintão
Diferentemente da expectativa do mercado, que era de forte retração de lançamentos de imóveis, puxada pelas incorporadoras com atuação principal nos padrões médio e alto, as prévias operacionais do terceiro trimestre divulgadas até agora apontam queda consolidada de 6,3%, ante o mesmo período do ano passado, para R$ 7,95 bilhões. As vendas líquidas cresceram 6,9%, para R$ 7,32 bilhões.
“A desaceleração apresentada pelas empresas das rendas média e alta foi menor do que se esperava”, afirma Bruno Mendonça, analista de mercado imobiliário do Bradesco BBI.
Havia expectativa de desaquecimento mais acentuado como reflexo do período eleitoral e dos juros mais altos, mas a sinalização ainda poderá mudar depois que todas as incorporadoras listadas em bolsa informarem lançamentos e vendas. Por enquanto, foram reportados os resultados operacionais de Cury, Cyrela, Direcional, Even, EZTec, Helbor, Melnick, Mitre, Moura Dubeux, MRV&Co, Tegra e Tenda.
No acumulado de janeiro a setembro, o setor lançou (VGV) de R$ 23,45 bilhões, com aumento de 1,8% na comparação anual. As vendas líquidas cresceram 6,4%, para R$ 21,45 bilhões. Há quem espere que este seja o segundo melhor ano da história do setor em relação a vendas, atrás apenas de 2021.
“Algumas empresas não quiseram correr o risco de apresentar empreendimentos em agosto e setembro, perto da eleição”, diz Fábio Tadeu Araújo, sócio da consultoria Brain Inteligência Estratégica. Em julho, o mercado começou a sentir uma desaceleração um pouco mais intensa, segundo Araújo, com redução do volume de lançamentos.
Retrações
A Even reduziu seus lançamentos em 75,5%, no trimestre, para R$ 161 milhões, As vendas, porém, aumentaram 24%, para R$ 342 milhões, puxadas pela comercialização de estoques. “Continuamos com a estratégia de dar um passo por vez. Como o segundo semestre está mais turbulento, o volume lançado está menor”, afirma Marcelo Dzik, diretor executivo de incorporação da companhia, citando as eleições presidenciais e a guerra da Rússia na Ucrânia.
Independentemente se mais projetos forem postergados, pondera Dzik, o ano de 2022 será “muito forte” para a Even, ainda que o VGV apresentado, neste ano, tenda a não alcançar o patamar de 2021.
No trimestre, a Mitre Realty vendeu 11,9% a mais do que um ano atrás, chegando a R$ 164,7 milhões. Em comparação ao segundo trimestre, porém, a comercialização caiu 13%. A Mitre encerrou o trimestre com estoque de R$ 1,59 bilhão, o que representa crescimento de 164,3% na comparação anual.
“Julho – primeiro mês de férias após a pandemia de covid-19 – foi fraco, com queda na visitação e das vendas. Houve melhora, na segunda quinzena de agosto, mas piora no consolidado do trimestre”, diz o vice-presidente de operações e diretor financeiro da Mitre, Rodrigo Cagali. As vendas caíram também devido à desmontagem dos estandes para início de obras dos empreendimentos.
Na avaliação de Cagali, várias incorporadoras deverão revisar para baixo o VGV projetado para o ano. A própria Mitre decidiu postergar parte do que estava previsto para o quarto trimestre diante do cenário que considera “desafiador”. “Ainda estamos em período eleitoral, e haverá a Copa do Mundo, evento que atrapalha vendas de imóveis”, diz o vice-presidente de operações.
Conhecidas pela atuação no Casa Verde e Amarela, MRV&Co e Tenda reduziram, respectivamente, o VGV dos projetos apresentados em 13,6% e 40,6%, para R$ 1,81 bilhão e R$ 376,2 milhões. As vendas líquidas da MRV&Co caíram 27,3%, para R$ 1,46 bilhão, enquanto as da Tenda tiveram retração de 36,5%, para R$ 489,3 milhões. As duas companhias deram prioridade ao aumento de preços dos produtos em relação aos volumes lançados.
A Trisul não fez nenhum lançamento no trimestre. Mas isso deveu-se, segundo Lucas Araújo, diretor de marketing e inteligência de mercado, mais ao tempo superior ao esperado para a obtenção de licenças e para que o estande de vendas de um dos projetos ficasse pronto do que ao cenário macroeconômico.
Destaques positivos
O desempenho da Cyrela chamou a atenção do mercado. A companhia fundada por Elie Horn elevou suas vendas em 49,5%, para R$ 1,71 bilhão e apresentou VGV de R$ 2 bilhões, ante R$ 1,89 bilhão lançado no terceiro trimestre do ano passado. Por outro lado, um analista que prefere não ser identificado destaca que a venda de estoque pronto da Cyrela foi “ruim”.
A EZTec registrou o maior volume trimestral de vendas brutas da sua história, chegando a R$ 481 milhões, com expansão anual de 72%. O desempenho foi puxado pelo lançamento comercial de um projeto já em construção. Por outro lado, a companhia reduziu seus lançamentos em 11%, para R$ 414 milhões. No mercado, há cautela em relação ao estoque de imóveis prontos da EZTec.
A Direcional – atuante na baixa renda com a marca que leva o nome da companhia e na média renda por meio da subsidiária Riva – registrou recordes de lançamentos e vendas no intervalo de julho a setembro. Os lançamentos consolidados cresceram 37,4%, para R$ 966,7 milhões, enquanto as vendas líquidas aumentaram 1,2%, para R$ 682,3 milhões.
“Os recordes do trimestre reforçam o sólido momento operacional da companhia, apesar dos desafios macroeconômicos”, avaliou o Bradesco BBI em relatório. Por segmento, Direcional elevou lançamentos em 19%, e Riva, em 73,4%. As vendas para a baixa renda caíram 8,9%, enquanto as de produtos de médio padrão aumentaram 28,7%. Por enquanto, a companhia mantém a previsão inicial de lançamentos para o quarto trimestre, conforme o presidente, Ricardo Ribeiro.
Retomada do Jardim das Perdizes
A Tecnisa lançou um empreendimento, no terceiro trimestre, com VGV de R$ 107,4 milhões. “Há um cenário de turbulências, com inflação ainda em alta e dificuldades para repassar preços. Tirando agosto e setembro, ruins para o mercado, em geral, os outros meses do ano foram relativamente bons, mas com margens pressionadas”, diz Fernando Perez, diretor presidente da incorporadora.
Recentemente, a Tecnisa apresentou a primeira fase de um empreendimento do bairro planejado Jardim das Perdizes, na zona Oeste de São Paulo. Com VGV total de R$ 218 milhões (parte própria de 57,5%), o Bosque Pitangueiras foi o primeiro lançamento da companhia, em oito anos, no seu maior projeto. Outro empreendimento será lançado, neste ano, no Jardim das Perdizes, além de um produto de alto padrão na Alameda Lorena. O VGV consolidado desses dois soma R$ 620 milhões.
A Tecnisa tem expectativa que, em até quatro meses, seja realizado leilão de Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs) da Operação Consorciada Água Branca – o último ocorreu em 2015. Se conseguir os títulos necessários para aumentar o potencial construtivo dos prédios do bairro planejado, a incorporadora apresentará, pelo menos, quatro torres do Jardim das Perdizes em 2023.
São Paulo
Na cidade de São Paulo – maior mercado imobiliário do país –, os lançamentos residenciais consolidados caíram 9,2%, em agosto, na comparação anual, para 7.036 unidades, de acordo com levantamento do Secovi-SP divulgado recentemente. As vendas tiveram queda de 15,1%, para 5.610 unidades.
No fim de agosto, havia 64.947 unidades disponíveis para comercialização, na capital paulista, incluindo imóveis na planta, em construção e prontos, segundo o Secovi-SP. Do total, 40% das unidades se enquadram no programa habitacional Casa Verde e Amarela, e 60% fazem parte de outros segmentos.
Em relatório, o Bradesco BBI comentou que uma desaceleração geral já era esperada, dado o ambiente macroeconômico, mas disse não ver indicações de uma deterioração mais acentuada e afirmou que os estoques estão relativamente estáveis.
Nordeste
Com atuação concentrada no Nordeste, a pernambucana Moura Dubeux elevou seu VGV lançado em 16%, no trimestre, para R$ 390,3 milhões. As vendas líquidas cresceram 4,3%, para R$ 357,8 milhões. “Não houve retração do mercado conforme se esperava”, diz o diretor financeiro e de relações com investidores, Marcello Dubeux.
Para este trimestre, a companhia projeta VGV pelo menos equivalente ao do período de julho a setembro. Os lançamentos ficarão em linha com a meta da Moura Dubeux para 2022, segundo o diretor de relações com investidores, mas não atingirão o que, em uma estimativa otimista a empresa traçou como “supermeta”. “Em 2023, conseguiremos manter o patamar de lançamentos deste ano provavelmente”, diz Dubeux.
Expectativas e rentabilidade
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Levantamento realizado pela Brain, em setembro, com 350 empresas de incorporação e loteamento aponta que, nos nove primeiros meses deste ano, 17% tiveram desempenho acima do esperado, 38% ficaram em linha com suas metas, 38% abaixo das estimativas e 7% não souberam avaliar.
“Para conseguir o patamar de vendas deste ano, as empresas precisaram abrir mão de rentabilidade ao não repassar todos os aumentos de custos”, afirma Araújo.
Nos últimos dois anos, a pressão de preços de materiais de construção foi a maior preocupação do setor, mas tem havido desaceleração dos aumentos dos valores. Em setembro, o Índice Nacional de Custo da Construção – M (INCC-M) teve leve alta de 0,1%, ou seja, abaixo da variação de 0,33% registrada em agosto. O indicador capta a evolução dos custos de construções residenciais.
No consolidado dos produtos, a pressão de custos de materiais diminuiu, o que resulta na expectativa de melhora das margens das incorporadoras em 2023, quando se espera também que a taxa básica de juros volte a cair. Entre as grandes economias mundiais, foi o Brasil quem puxou a fila dos aumentos de juros para controlar a inflação. Enquanto o país já começou a interromper as altas, Estados Unidos e União Europeia ainda não podem fazer o mesmo.