Estabilização de custos traz alívio para incorporadoras e contribui para preparação de retomada para 2023
Ainda assim, diante das incertezas, empresas com foco em imóveis dos padrões médio e alto seguem cautelosas e continuam a tomar as decisões de lançamentos caso a caso
Por Redação Em:
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Por Chiara Quintão
A interrupção dos aumentos de boa parte das matérias-primas utilizadas na construção torna o ambiente de custos mais previsível para incorporadoras e tende a se refletir em margens menos pressionadas neste semestre. Ainda assim, as empresas com foco nos padrões médio e alto seguem cautelosas e continuam a tomar as decisões de lançamentos, projeto a projeto, diante de preços dos imóveis próximos do que se considera o limite para o atual cenário e das incertezas acentuadas pelas eleições majoritárias no Brasil, pela Copa do Mundo e pela continuidade da guerra na Ucrânia.
“Queremos acreditar que dá pra lançar, mas vamos avaliar caso a caso”, afirmou Raphael Horn, copresidente da Cyrela em teleconferência para comentar os resultados do segundo trimestre. A incorporadora continua a apresentar empreendimentos, de acordo com Horn, por ter expectativa de boa velocidade de vendas em relação a produtos diferenciados e com boa localização. “Se o cenário piorar muito, teremos de rever lançamentos”, contou o copresidente, acrescentando que torce pela queda dos juros.
Nos últimos 24 meses, os preços de venda dos imóveis da Cyrela “subiram bastante”, conforme Horn, mas menos do que o Índice Nacional de Custos da Construção (INCC). A companhia continuará a fazer reajustes. “Tentamos precificar os produtos da melhor forma possível, mas não parece haver muito espaço para altas”, disse. A Cyrela tem buscado atingir a viabilidade traçada para cada projeto. No período de 2018 a 2020, era possível excedê-la.
Em função do ritmo de vendas, a Even mantém seu planejamento de lançamentos e pode apresentar Valor Geral de Vendas (VGV) “até um pouco mais alto do que estimava no início do ano”, segundo o presidente, Leandro Melnick. “Estamos focando em projetos com mais valor agregado do que os dos concorrentes principais”, afirmou Melnick. No segmento de alto padrão, a companhia tem repassado as altas do INCC para os preços e, nos demais, “boa parte” do índice, de acordo com o presidente.
Durante a temporada de balanços, incorporadoras informaram ter havido arrefecimento dos preços de aço, cobre e PVC, enquanto os de insumos derivados do cimento seguem pressionados.
Na EZTec, os custos chegaram a superar o INCC em 50% e, atualmente, estão 38% acima do indicador, segundo o diretor financeiro e de relações com investidores, Emilio Fugazza. Ele ressaltou que, além de a incorporadora ter sido informada por fornecedores de queda dos valores de alguns insumos, o dissídio da mão de obra – que teve forte impacto no INCC do segundo trimestre – já está previsto nos próximos orçamentos.
No primeiro semestre, a EZTec apresentou R$ 903 milhões em projetos. “Temos mais lançamentos a fazer. A pandemia de covid-19, a guerra da Ucrânia, as eleições e a Copa nos levam a ser cautelosos, mas temos um VGV bem arrojado para lançar, considerando o cenário que estamos enfrentando”, disse Silvio Zarzur, diretor vice-presidente, de incorporação e de novos negócios.
Rodrigo Cagali, vice-presidente de operações e diretor financeiro da Mitre Realty, compara que o cenário está melhor para as incorporadoras com foco nas rendas média e alta, do ponto de vista da inflação, mas mais desafiador do lado comercial. “Achamos que o preço dos imóveis está mais perto do limite. E, apesar de a economia estar superando as expectativas, o desempenho tende a ser mais volátil, neste semestre, em razão dos eventos”, afirmou Cagali.
Habitação popular
No segmento de baixa renda, as expectativas das incorporadoras melhoraram com as mudanças anunciadas no Casa Verde e Amarela, que incluíram aumento dos subsídios e dos limites de preços dos grupos 2 e 3 do programa habitacional. “Parte das famílias que estavam fora passaram a ter capacidade de compra novamente”, disse o presidente da Direcional, Ricardo Ribeiro.
Empresas com atuação em habitação popular destacam a forte demanda por imóveis do segmento. “Esperamos velocidade de vendas mais próxima da registrada no segundo trimestre do que daquela de dois, três anos atrás, quando o custo de construção estava mais baixo”, afirmou o presidente da Direcional.
A MRV&Co – maior incorporadora do país e principal empresa com atuação na baixa renda – deixou claro que vai elevar seus lançamentos, no Brasil, financiados com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). “Nossa confiança em relação à rentabilidade dos projetos está maior”, disse Ricardo Paixão, diretor executivo de finanças e relações com investidores.
Diferentemente da MRV, a Cury concentrou lançamentos no primeiro semestre. “Começamos o terceiro trimestre tão bem como terminamos o segundo, mas não acredito que continuaremos nesse ritmo, por conta das eleições e da Copa”, disse Fábio Cury, presidente. Segundo ele, os custos de insumos como madeira, cobre e caixilhos de alumínio estão “mais estabilizados”. “Mas é prematuro dizer se isso será prolongado.”
No programa habitacional, a concorrência por clientes no programa diminuiu, pois empresas menores deixaram de ser competitivas diante dos aumentos de preços. Mesmo com custos de produção mais administráveis, não se espera retorno imediato das pequenas ao mercado, devido ao tempo necessário para a compra de terrenos, a aprovação de projetos e a apresentação dos empreendimentos.
Quem segue no páreo tem conseguido elevar preços e avalia que é possível fazer novos aumentos. “Ainda há espaço, mas menos do que antes, dependendo do projeto e da localização”, ponderou Cury.
No primeiro semestre, o tíquete médio dos produtos da MRV enquadrados no programa habitacional acumulou alta de 11,06%, ou seja, ficou acima do INCC, de 7,53% no período. Segundo Eduardo Fischer, copresidente, a companhia continuará a reajustar os preços dos imóveis, mas existe “receio natural de impacto na liquidez das vendas”.
As incorporadoras aguardam sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro, do aumento do prazo de financiamento imobiliário pela Caixa Econômica Federal de 30 anos para 35 anos e da liberação para que os 8% mensais do salário dos trabalhadores com carteira assinada recolhidos pelas empresas para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) possam ser utilizados para abatimento da compra da casa própria. Se entrarem em vigor, de fato, as medidas tendem a estimular as vendas.