INCC ainda em alta leva incorporadoras a revisar projetos e substituir materiais para cortar custos
Empresas buscam soluções para mitigar impactos dos aumentos das matérias-primas em um cenário mais desafiador para elevação de preços dos imóveis.
Por Redação Em:
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Por Chiara Quintão
A continuidade das pressões de custos de materiais de construção tem levado incorporadoras a buscar mais eficiência em seus projetos, seja pela substituição de insumos e mudança de fornecedores, ou até mesmo pela redução de áreas não vendáveis dos condomínios. Essas medidas têm como objetivo mitigar, ainda que parcialmente, os impactos dos aumentos das matérias-primas, considerando-se que há limites, no bolso do consumidor, para as altas de preços dos imóveis decorrentes dos incrementos de custos.
A pressão de custos começou a se acentuar, há quase dois anos, com o desarranjo da cadeia mundial de produção. Nos três primeiros meses da pandemia de covid-19, a demanda por insumos despencou e, na sequência, cresceu de forma vertiginosa. Os preços das commodities tiveram forte alta, no segundo semestre de 2020 e no ano passado, mas havia expectativa de acomodação ao longo da primeira metade de 2022. Com a invasão da Ucrânia pela Rússia, mais um fator de pressão foi adicionado aos custos.
Nesse cenário, incorporadoras tentam, outra vez, reduzir gastos onde for possível. “Reavaliamos os projetos e, às vezes, encontramos oportunidades de economia em um cantinho não vendável”, conta o diretor presidente e de relações com investidores da RNI Negócios Imobiliários, Carlos Bianconi. A incorporadora tem buscado, por exemplo, reduzir ou eliminar o “shaft” – espaço no meio das torres para as tubulações elétricas e hidráulicas –, além de diminuir a geração de resíduos nas obras.
As discussões para “reaproveitar cada centavo” abrangem, segundo Bianconi, as áreas técnica e de desenvolvimento de negócios. Para evitar sustos com desembolsos muito superiores aos gastos orçados, a RNI revisa seus custos mensalmente.
A Mitre Realty tem substituído, sempre que o projeto permite, madeira por forma plástica na estrutura dos prédios. A economia de custos por empreendimento é marginal, segundo o vice-presidente de operações e diretor financeiro, Rodrigo Cagali, mas faz diferença quando se considera a produção em escala. Para futuros empreendimentos, a Mitre está avaliando se os clientes pretendem manter ou trocar os acabamentos de piso e parede nas chamadas áreas molhadas, como as de cozinha e banheiro. “Se as pessoas forem quebrar a cozinha inteira, não vale a pena a entrega com acabamentos”, diz Cagali.
A SKR Construtora e Incorporadora passou a buscar fornecedores de elementos de fachada e alguns revestimentos especiais fora do Estado de São Paulo nos casos em que considera possível manter qualidade semelhante à dos provedores tradicionais. Apesar dos custos mais elevados com frete, a empresa tem conseguido economizar com a estratégia adotada, segundo Rubens Czeresnia Taragona, head of asset and property management da SKR.
Ao avaliar custos de materiais e preços potenciais dos imóveis, a Helbor pode optar, conforme as condições comerciais, por substituir alguns insumos das áreas comuns dos empreendimentos. É o caso da alteração de revestimentos de fachada em alumínio por itens cerâmicos. “Estudamos soluções tecnológicas que não afetem a qualidade final do produto”, diz o diretor técnico, Carlos Kehdi.
No primeiro trimestre, a MRV – maior incorporadora do país – deu continuidade à estratégia adotada no ano passado de manter alto nível de estoque de materiais de construção. A medida possibilita que a companhia se proteja de parte das altas de insumos, mas contribui para o consumo de caixa das suas operações de incorporação no Brasil.
As iniciativas para obtenção de mais eficiência na construção afetam também a forma de busca de terrenos pelas incorporadoras. Ao avaliar uma área, a Mitre interrompe as negociações, segundo Cagali, se percebe que será necessário utilizar “a fundação mais cara” nas obras. Na RNI, a análise da principal matéria-prima imobiliária leva em conta, cada vez mais, as contrapartidas exigidas para a construção em cada região. “Estamos buscando terrenos com contrapartidas menores”, afirma Bianconi.
De modo geral, incorporadoras vêm tentando compensar, nas negociações de terrenos, os impactos das altas dos preços dos materiais. Na prática, com os aumentos de custos dos últimos dois anos, as empresas estão menos dispostas a pagar qualquer preço pelas áreas.
Diante de um ambiente mais desafiador, algumas companhias estão mais rigorosas na definição do melhor momento para lançar seus projetos. A RNI lançou, no mês passado, um empreendimento previsto, inicialmente, para dezembro. “Conseguimos otimizar os custos e melhorar o VGV [Valor Geral de Venda]”, diz Bianconi.
Ao realizar lançamentos, as incorporadoras têm oferecido ao mercado unidades com preços médios maiores do que os de antes da escalada do Índice Nacional de Custos da Construção (INCC). Até as chaves, as parcelas pagas pelos compradores são reajustadas pelo INCC, o que resulta em um certo “hedge” da inflação para as empresas. “Mas o INCC não está acompanhando o aumento real dos custos. Nos últimos dois anos, as obras subiram 20% acima do INCC. Há um desequilíbrio nos contratos firmados”, diz Taragona.
Calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o INCC-M teve alta de 2,81% em junho. No ano, o indicador acumula aumento de 7,2% e, em 12 meses, de 11,75%.