Captação de poupança diminui e bancos aumentam rigor na concessão de crédito para imóveis usados

Desembolsos caíram 28% no mercado secundário no primeiro semestre

Por Redação Em:

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Por Chiara Quintão

A piora do ambiente macroeconômico tem afetado, muito mais, a concessão de crédito imobiliário para imóveis usados do que para novos. De janeiro a junho, enquanto o financiamento habitacional com recursos de poupança para unidades novas cresceu 5%, para R$ 26 bilhões, os desembolsos para moradias usadas caíram 28%, para R$ 39,5 bilhões. No total financiado, a participação dos imóveis usados foi reduzida dos 69% do primeiro semestre do ano passado para 60%.

“O financiamento de imóvel novo  tem menos correlação com a economia do que o de usado”, disse José Rocha, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), em coletiva de imprensa. No mercado secundário, ressalta Bruno Mendonça, analista de mercado imobiliário do Bradesco BBI, o comprador “tende a ser mais sensível ao ambiente macroeconômico”.

Ainda assim, as vendas de imóveis usados cresceram 4,1%, na capital paulista, no primeiro semestre, de acordo com o Conselho Regional de Corretores de Imóveis (CRECI/SP). Com exceção do mês de janeiro, as vendas à vista superaram as financiadas no semestre. “Com o juro muito alto, a renda familiar acaba não alcançando o que o banco exige [para o pagamento da parcela]”, diz José Augusto Viana Neto, presidente da entidade. A situação não está pior, segundo Viana, porque os níveis de emprego melhoraram.

No Estado de São Paulo, aponta levantamento do CRECI/SP, houve queda de 10,6% de janeiro a maio.

Em situações em que os bancos precisam ser mais rigorosos na concessão de financiamento devido ao aumento dos saques de poupança e de os recursos para habitação já estarem enquadrados na exigibilidade de 65% do direcionamento da poupança, o ajuste ocorre, inicialmente, nos desembolsos para imóveis usados. No primeiro semestre, a captação de poupança – principal fonte de crédito imobiliário – caiu 1,3%, para R$ 779 bilhões, segundo a Abecip.

Diante de juros e inflação em ascensão, há também muitos potenciais compradores que preferem adiar a compra da moradia usada, principalmente quando não se trata do primeiro imóvel, e a finalidade da aquisição é a mudança para uma unidade de padrão superior ou com localização melhor. 

Imóveis novos

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Quando um imóvel novo é comprado na planta, a contratação do financiamento bancário ocorre no recebimento das chaves do imóvel. Na prática, a concessão dos recursos ocorre em função da entrega da unidade e não da venda. “Se o banco já financiou a incorporadora, não vai negar o financiamento ao cliente, pois seria um tiro no pé”, diz o analista do Bradesco BBI.

 

O comprador que não consegue o crédito numa instituição financeira pode procurar outra ou ser enquadrado na tabela direta da incorporadora. Mas há o risco de ele ficar inadimplente, prejudicando o pagamento dos recursos do banco tomados pela empresa. Outro ponto que justifica que os bancos prefiram direcionar o crédito para o mercado primário é a possibilidade de acesso ao perfil de pagamento dos clientes para as incorporadoras no período pré-chaves.

 

Parte do valor do imóvel – cerca de 30% na faixa de média renda – é paga durante a construção. Mesmo com juros maiores do financiamento imobiliário, destaca o presidente da Abecip, o cliente faz todo o possível para não desistir da aquisição, evitando arcar com as penalidades dos distratos. “Se o mutuário tiver de abrir mão de alguma coisa, não vai ser do imóvel provavelmente”, diz.

 

Os aumentos de preços das unidades são outro fator que desestimula a rescisão de vendas. Em junho deste ano, o Índice Geral do Mercado Imobiliário Residencial (IGM-R) Abecip apontou aumento nominal de 16,4% dos preços na comparação anual. As maiores altas foram registradas no Rio de Janeiro (19,4%) e em São Paulo (17,1%). “Ainda haverá valorização, nos próximos meses, mas de forma desacelerada”, diz Rocha. De 2014 a 2016, a queda de preços foi um dos fatores vistos como incentivos aos cancelamentos de vendas recordes do período.

Crédito para obras

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Em relação ao financiamento para a construção de imóveis, houve aumento de 16%, no primeiro semestre, ante o mesmo período do ano passado, para R$ 20,2 bilhões, de acordo com a Abecip. De janeiro a junho, os lançamentos residenciais, na cidade de São Paulo somaram 32,9 mil unidades, conforme levantamento do Secovi-SP. 

 

Na avaliação de Rocha, como os estoques de unidades prontas das incorporadoras estão baixos, e as empresas possuem terrenos, a tendência é que as incorporadoras deem continuidade aos lançamentos diante da expectativa de inflação e juros menores em 2024. 

 

Somando-se construção e aquisição de imóveis, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) financiou o total de R$ 85,7 bilhões, no primeiro semestre, o que representa queda de 12%. Se incluídos, além dos recursos da poupança, as concessões do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a retração foi de 6%, para R$ 112,8 bilhões. Separadamente, o FGTS financiou R$ 27,1 bilhões, ou seja, 17% a mais do que nos seis primeiros meses do ano passado. 

Expectativas

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A Abecip projeta que, no acumulado do ano, as concessões totais de crédito imobiliário terão retração de 4%, para R$ 244 bilhões. “Será o segundo melhor ano do setor, atrás de 2021”, afirma o presidente da entidade, ressaltando que, outra vez, a marca de 1 milhão de unidades financiadas será batida. Os desembolsos com recursos da poupança cairão 12%, para R$ 180 bilhões, enquanto os financiamentos com dinheiro do FGTS apresentarão crescimento de 31%, para R$ 64 bilhões. 

Para Rocha, o aumento anunciado, recentemente, pelo Comitê de Política Monetária (Copom) de 0,5 ponto percentual na Selic deverá ter pouco impacto nas taxas de financiamento imobiliário. “Não acho que faltará crédito, mas talvez fique mais caro”, diz Mendonça. O analista do Bradesco BBI compara que o custo médio de captação de recursos pelos bancos está superior ao do ano passado, mas não aumentou na mesma proporção da Selic.

Na avaliação de Hugo Grassi, analista do Citi Brasil, o “fiel” do patamar de juros do crédito habitacional continua a ser a Caixa Econômica Federal – principal agente de concessão de recursos para o segmento. Se os demais bancos que financiam o setor imobiliário oferecerem taxas muito acima das do banco público, “serão condenados a uma participação irrisória, convergindo para originação próxima de zero”, segundo Grassi.

De janeiro a julho, a Caixa Econômica Federal elevou suas concessões de crédito imobiliário em 17%, para R$ 90,5 bilhões. Em julho, registrou sua maior contratação mensal de financiamento habitacional, de R$ 16,3 bilhões, com alta de 38,8% ante o valor de junho, e anunciou redução das taxas cobradas ao crédito para a casa própria. 

O presidente do CRECI/SP diz não esperar aumento de juros do financiamento habitacional neste semestre. No entendimento de Viana, a venda de imóveis usados na segunda metade do ano será melhor do que na primeira em São Paulo. 

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