Compactos: há excesso de oferta em São Paulo?

Os lançamentos de studios cresceram como consequência da legislação e da alta dos preços de imóveis, atraindo compradores finais e investidores

Por Redação Em:

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Por Chiara Quintão

O grande volume lançado desde 2019 de studios e imóveis compactos começa a ser entregue, em São Paulo, reforçando a preocupação do mercado se chegou o momento de excesso de oferta dessas unidades. Ainda há demanda por unidades compactas localizadas nas proximidades de estações de metrô, de hospitais e faculdades, dizem as fontes ouvidas pela UBlink, mas os imóveis afastados de redes de transporte público podem ficar desocupados por mais tempo em regiões com maior disponibilidade de produtos.

Dados do mercado paulistano levantados pelo Secovi-SP evidenciam que a participação de unidades de um dormitório no total apresentado dobrou em relação a 2016, passando de 15,1%, naquele ano, para 30,4% de janeiro a julho de 2022. O segmento chegou a representar 33% do total no ano passado. 

“Antigamente, os compactos eram destinados a solteiros ou para turismo de negócios, mas hoje a demanda é bem mais abrangente. As famílias estão reduzindo de tamanho, há casamentos de pessoas do mesmo sexo e, na cidade de São Paulo, a renda do setor financeiro e de serviços aumentou”, diz Rogério Santos, um dos fundadores da UBlink. No último mês, a startup intermediou operações de aluguel de mais de 80 unidades pertencentes a investidores institucionais para serem sub-locadas para clientes diversos.

No mercado, entre os ocupantes dos imóveis compactos, destacam-se pessoas solteiras, casais sem filhos, moradores de outras cidades que optam por ter uma base na capital paulista e investidores interessados na locação. 

Em 2020, dos compradores de unidades com até 45 metros quadrados, por meio da startup de venda de imóveis Apto, 62% tinham entre 18 e 34 anos. No ano passado, essa faixa etária correspondia a 65% do total, e até setembro de 2022, a 59%. Dos anúncios de lançamentos realizados por incorporadoras, na capital paulista, na plataforma do Apto, unidades de até 45 metros quadrados foram equivalentes a 23% do total nos nove meses deste ano. 

“Os studios continuam vendendo desde que tenham boa localização, como em Pinheiros, no Itaim Bibi e na Vila Mariana”, afirma Lucas Araújo, diretor de marketing e inteligência de mercado da Trisul. Quase metade dos clientes dessas unidades da Trisul, na capital paulista, são pessoas que vivem em regiões cuja economia é puxada pelo agronegócio. “Há quem compre para ter uma base em São Paulo e também para investir”, diz Araújo. 

Dados do Secovi-SP demonstram que de 2018 até julho deste ano, o total de unidades de um dormitório superou 81 mil em São Paulo. Esse número consolidado fica muito próximo do recorde de 81,8 mil unidades apresentadas, na capital paulista, em todos os segmentos em 2021.

Para o fundador da Vitacon, Alexandre Frankel, é preciso haver cautela na avaliação dos dados referentes às unidades de um e dois dormitórios, na capital paulista, pois parte dos imóveis se refere a empreendimentos enquadrados no programa habitacional Casa Verde e Amarela, não contribuindo para a pressão de estoques dos padrões médio e alto.

“Aparentemente, há super oferta de compactos, mas não é isso o que ocorre. Após anos recordes de produção, temos uma entrega concentrada e um momento econômico desafiador, resultando em uma curva de absorção mais lenta”, destaca Frankel, acrescentando que haveria oferta excedente se o número de clientes não fosse suficiente para ocupar as moradias. 

A partir dos aumentos da Selic e, consequentemente, do crédito imobiliário, o apetite dos investidores por studios e compactos diminuiu, mas não estancou. Enquanto a taxa básica de juros aumentou de 2% para 13,75%, o custo do financiamento habitacional passou de 6,5% para 9%. Parte dos potenciais compradores para locação passou a preferir investir em renda fixa. 

Legislação

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Nos últimos anos, os lançamentos de studios cresceram como consequência das regras do Plano Diretor e da Lei de Zoneamento de São Paulo, que limitam o número de garagens a uma vaga por unidade nos empreendimentos localizados nas proximidades de estações de metrôs e trens, e de corredores de ônibus. Na prática, ao incluir studios sem garagem no projeto, as incorporadoras conseguem oferecer mais de uma vaga aos proprietários de apartamentos maiores nos empreendimentos dessas regiões.

 

Chamados, no jargão do setor imobiliário de NR (unidades não residenciais), os studios têm também a vantagem de não serem contabilizados como área construída, possibilitando melhor aproveitamento do terreno. Diante dos estímulos oferecidos pela legislação, boa parte das incorporadoras apostou na inclusão dessa tipologia em seus projetos.

 

Além disso, de 2018 ao início do ano passado, os recordes de baixa da Selic tinham se refletido em menos rentabilidade das aplicações de renda fixa e em taxas de juros menores do financiamento habitacional, o que incentivou a compra de imóveis para renda pelo aluguel.

 

A aposta em unidades menores resultou também da intenção de incorporadoras de fazer o preço cheio dos imóveis caber no bolso de parte dos consumidores. Tamanhos menores possibilitaram valores de unidades relativamente acessíveis, mesmo quando o preço por metro quadrado é considerado elevado.

Estratégias

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Atenta à possibilidade de oferta excedente, a Mitre Reaty já avalia que seus futuros lançamentos deixem de ter uma parcela de studios. A decisão será tomada, caso a caso, segundo o vice-presidente de operações e diretor financeiro, Rodrigo Cagali. Caso essa tipologia deixe de integrar os empreendimentos residenciais, o preço por metro quadrado dos imóveis poderá ficar mais caro, como consequência da diminuição da área construída.

Por enquanto, conta Cagali, a Mitre continua “vendendo bem” studios e compactos. “Temos pouco estoque, mas há um limite [de absorção] na cidade de São Paulo. No mercado, há muitas entregas, em 2022, e mais ainda no ano que vem”, diz o vice-presidente de operações. 

Em meados de 2021, a Mitre fechou parceria com a Atlantica Residences, divisão de locação residencial da Atlantica Hospitality International (AHI). Pelo acordo, clientes de studios de alguns projetos da incorporadora podem ter acesso à plataforma de locação, o que estimula a compra por investidores.

Recentemente, foi a vez da Even anunciar acordo com a Atlantica Residences, que fará a gestão do aluguel dos studios de dois empreendimentos da incorporadora. “Não vejo ainda sinais de super oferta, e a Even não carrega estoques prontos”, conta Marcelo Dzik, diretor executivo de incorporação da Even. Studios e outras unidades compactas da companhia têm sido vendidos, principalmente, para investidores.

Segundo Dzik, a melhor proteção possível em relação a um eventual futuro excesso de oferta é ter produtos bem estruturados, nas proximidades de metrôs, colégios e universidades. “Oscilações de produtos, no mercado, podem ocorrer sempre”, diz o diretor da Even.

Como reflexo do aumento da entrega de unidades compactas, a empresa de hospitalidade Charlie vai terminar 2022 com 1.000 apartamentos em operação, ou seja, quatro vezes o que tinha em carteira no início do ano. Segundo o CEO, Allan Sztokfisz, tem sido possível manter as taxas de ocupação mesmo com o crescimento. A maioria das unidades está localizada na capital paulista, nos bairros Moema, Vila Mariana, Pinheiros, Jardins, Itaim Bibi, Vila Olímpia, Campo Belo e Centro.

A startup faz a gestão dos studios de clientes de incorporadoras como Cyrela (sua parceira) e EZTec, entre outras, com prazos de locação de um dia a um ano. A maior parte dos empreendimentos fica na capital paulista. Do total de locações, 80% são inferiores a 30 dias, contratadas por quem vem a São Paulo para eventos de negócio ou lazer, para fazer compras, cursos ou tratamentos de saúde.

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