Por que as zonas Sul e Oeste de São Paulo concentram tantos lançamentos imobiliários?

Das 36.454 unidades residenciais lançadas em São Paulo nos sete meses até julho, a zona Sudoeste respondeu por 57%, segundo levantamento do Secovi-SP

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Por Chiara Quintão

Quando as incorporadoras, principalmente aquelas de capital aberto, anunciam um lançamento imobiliário residencial dos padrões médio ou alto na cidade de São Paulo, o mais provável é que o projeto esteja previsto para ser desenvolvido em um terreno localizado nas zonas Sul ou Oeste da capital paulista. São essas as regiões que concentram os centros financeiros e as rendas médias mais elevadas de São Paulo. 

“A pressão de preços, nesses lugares, diminuiu com o impacto da pandemia de covid-19, mas agora acontece, aparentemente, um movimento de retomada do interesse e uma busca frequente por bairros mais próximos dos polos empresariais. Assim, o Sudoeste tende a continuar a ser a região mais valorizada da capital paulista”, afirma Rogério Santos, um dos fundadores da startup UBlink.

Das 36.454 unidades residenciais lançadas em São Paulo nos sete meses até julho, a zona Sul respondeu por 11.071 imóveis, e a região Oeste, por 9.690, segundo o Secovi-SP. Em conjunto, o volume lançado nas duas regiões correspondeu a 57% do total apresentado na cidade. 

Não há uma divisão por faixa de renda nos dados do Secovi-SP, mas o histórico do mercado demonstra que essas áreas da cidade são buscadas pelas incorporadoras listadas em bolsa, principalmente, para projetos destinados aos padrões médio e alto. 

No mercado paulistano, existe uma região conhecida como “Little Manhattan”, que tem como limites Pompeia/Perdizes, Chácara Klabin, Bela Vista e Chácara Santo Antônio, segundo Emilio Fugazza, diretor financeiro e de relações com investidores da EZTec. “Dois terços dos prédios de São Paulo se concentram aí, onde está a formação do PIB [Produto Interno Bruto] da cidade”, afirma o diretor de relações com investidores. 

É na “Little Manhattan”, diz Fugazza, que estão as sedes das principais empresas, dos bancos, “uma quantidade enorme de shopping centers” e serviços e infraestrutura de melhor qualidade. “Existe mais dinheiro em circulação, o que faz com que o risco para quem investe [no desenvolvimento imobiliário nessa área] seja menor”, afirma o executivo da EZTec.

A concentração de escritórios comerciais e serviços no Sudoeste paulistano também justifica a atratividade de demanda e oferta. Há “um lado aspiracional de as pessoas quererem morar nas proximidades do trabalho”, segundo Lucas Araújo, diretor de marketing e inteligência de mercado da Trisul, ao mesmo tempo que, para sobreviver, as incorporadoras atuam “onde a conta fecha”.

A demanda por imóveis nas regiões Sul e Oeste se traduz nos preços de venda. 

“Nos Jardins, por exemplo, há lançamentos com preço por metro quadrado de R$ 35 mil a R$ 40 mil”, diz Rubens Czeresnia Taragona, head of asset and property management da SKR Construtora e Incorporadora, com atuação focada nas zonas Sul e Oeste. Até o fim do ano, a SKR apresentará um projeto nos Jardins.

Ao possibilitar maior potencial construtivo nos empreendimentos residenciais desenvolvidos nas proximidades de estações de metrô e corredores de ônibus, o Plano Diretor também favorece as regiões Sul e Oeste, por serem as melhor atendidas pelas malhas de transporte público no maior mercado imobiliário do país.

“O Plano Diretor incentivou moradias próximas ao trabalho. Essa ideia se mescla à busca de comodidade e serviços pelas pessoas, principalmente nos bairros de alto padrão”, afirma Marcelo Dzik, diretor executivo de incorporação da Even. Em 2019, a incorporadora lançou o empreendimento de alto luxo Fasano Itaim. “O Itaim é a grande vedete do alto padrão em São Paulo”, diz o executivo da Even. A companhia prepara lançamento para a alta renda, em Pinheiros, com residencial, hotel e serviços, ainda sem data de apresentação.

Na esteira da história dos escritórios e da economia da cidade

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Restaurante Belvedere Trianon, onde foi erguido, posteriormente, o Masp

A história dos centros financeiros e eixos de escritórios comerciais de São Paulo e o próprio desenvolvimento econômico da cidade explicam parte da demanda por moradias nas regiões Sul e Oeste. À medida que houve mudanças nas regiões prioritárias do segmento, cresceu também a procura por imóveis residenciais nas novas áreas, o que orientou muitas incorporadoras em relação à escolha de onde erguer seus projetos.

 

“A Avenida Paulista começou a se desenvolver a partir de um restaurante incrível, chamado Belvedere Trianon [onde foi erguido, posteriormente, o Masp], que tinha um mirante para o centro de São Paulo. Foi construída no ponto mais alto da cidade até então. Em seguida, ocorreu o loteamento dos Jardins – Paulista, América e Europa –, para habitações da população de alta renda na época”, conta o fundador da UBlink e apreciador da história de São Paulo.

 

Nas décadas de 1960 e 1970, prédios de escritórios passaram a compor a região da Avenida Paulista.  Bancos se mudaram do Centro para a avenida, que só perdeu parte da importância como centro financeiro de São Paulo na década de 2000. “Com a ocupação de toda a Paulista, se fez necessário o desenvolvimento de um novo eixo empresarial, o que resultou na ocupação da Faria Lima”, diz Santos.

 

Empreendimentos comerciais foram, gradualmente, desde o fim dos anos 1990, conquistando espaços na Avenida Brigadeiro Faria Lima, a partir da extensão da avenida para além do Largo da Batata, de um lado, e da Avenida Hélio Pellegrino, do outro. Foi no meio da década de 2010, que a Faria Lima se tornou o endereço comercial mais cobiçado (e caro!) de São Paulo. 

 

Muitos empreendimentos foram desenvolvidos na Berrini a partir dos anos 2000. “Até então, a Berrini era um polo de pequenos escritórios prestadores de serviços de grandes empresas sediadas na Paulista e na Faria Lima”, afirma o fundador da UBlink. 

 

Com a desapropriação de residências da Vila Olímpia, a área de influência dos escritórios da Faria Lima se ampliou para o bairro. “A Vila Olímpia era composta, basicamente, por casinhas e tem hoje outro perfil de ocupação e arquitetônico”, diz Santos.

 

Atualmente, a principal região em desenvolvimento de escritórios da capital paulista é a Chucri Zaidan. A Rebouças é outro polo em crescimento, destaca o diretor de locação e pesquisa da consultoria CBRE, Felipe Robert Giuliano, com muitos prédios em construção.

 

Levantamento da CBRE aponta que a região da Marginal Pinheiros – incluindo os prédios da Berrini e da Chucri Zaidan – responde por 27% do estoque de escritórios da cidade, enquanto os Jardins – abrangendo Pinheiros, Faria Lima, Juscelino Kubitschek e Itaim Bibi – detêm a fatia de 17%.

Metrôs

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As estações de metrô sempre deram forte impulso ao mercado imobiliário

A Linha 1 – Azul, primeira linha de metrô de São Paulo, começou a operar com o nome de Linha Norte-Sul, em 1974, quando foram abertas as estações Vila Mariana, Santa Cruz, Praça da Árvore, Saúde, São Judas, Conceição e Jabaquara. A inauguração da estação Santana, a primeira da zona Norte, ocorreu em 1975.

 

Aos poucos, a capital paulista foi ganhando outras linhas – Vermelha, Verde, Lilás e Amarela. De modo geral, cada vez que uma estação é inaugurada, mais empreendimentos são erguidos ao redor, com consequente valorização dos preços.

 

Foi o que ocorreu, por exemplo, no entorno das estações Faria Lima e Fradique Coutinho, entre outras, da Linha 4 – Amarela. Na zona Sul, a parada Brooklin, da Linha 5 – Lilás contribuiu para que mais incorporadoras como Mitre Realty, EZTec e Gamaro, se interessassem por terrenos na Avenida Roque Petroni Júnior.

 

A Linha 6 – Laranja do metrô ainda está em obras, mas já se reflete em fortes movimentações do mercado imobiliário nos entornos das estações, principalmente na região da Pompeia e de Perdizes. Desde 2019, o número de lançamentos teve forte crescimento nos dois bairros, elevando o adensamento que vinha ocorrendo nos dois bairros da zona Oeste.

 

Rodrigo Mauro, diretor-geral da REM Construtora, ressalta que Pompeia e Perdizes são “bairros nobres e com boa infraestrutura”, mas com preços mais acessíveis, por exemplo, do que os dos Jardins, de Pinheiros e do Itaim Bibi, cujos preços tiveram alta expressivas nos últimos anos. 

 

Os bairros da zona Oeste que serão atendidos por paradas da Linha Laranja chamam a atenção de quem trabalha perto de estações de metrô na capital paulista. “É possível vendermos os imóveis tanto para investidores, que podem alugar a unidade para quem vem a São Paulo para eventos como Fórmula 1, Parada Gay ou feiras, quanto para compradores finais, como um morador de Ribeirão Preto que quer vir, de vez em quando, para fazer compras no Iguatemi”, afirma Mauro.

Limites das zonas Norte e Leste

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A Zona Norte respondeu por apenas 9,6% dos lançamentos de São Paulo no período de janeiro a julho

Tradicionalmente, a zona Norte de São Paulo é a que recebe menos investimentos das incorporadoras. De janeiro a julho, foram lançadas 3.491 unidades, na região, o correspondente a apenas 9,6% do total da cidade. Da região, Santana é o bairro que mais atrai lançamentos. “Desde 2010, não há benefícios de zoneamento para a zona Norte”, diz Araújo, da Trisul. 

 

Para o diretor-geral da Benx, Luciano Amaral, a zona Norte desperta menos o interesse de boa parte das incorporadoras atuantes na cidade por ser limitada pela Serra da Cantareira e situada, em sua maior parte, do lado da Marginal Tietê mais afastado do Centro. “Os polos geradores de emprego estão no Centro e nas zonas Sul e Oeste”, afirma Amaral.

 

Fugazza, da EZTec, diz que “há bolsões de serviços e riqueza”, nas zonas Norte e Leste e que, muitas vezes, são incorporadoras e construtoras com atuação local nessas regiões.

 

Santos, da UBlink, destaca que Mooca, Tatuapé e Santana cresceram como bairros dormitórios dos trabalhadores das indústrias e dos serviços de São Paulo. “Mas  não ficaram parados no tempo, se desenvolveram e criaram seus próprios polos empresariais. São os casos do Tatuapé, com o Jardim Anália Franco, e a região de Santana, com a Brás Leme e o comércio popular na Voluntários da Pátria”, diz o fundador da UBlink. Santos acrescenta que todo bairro precisa atender às necessidades de seus moradores, com infraestrutura apropriada de comércio e serviços.

 

Atualmente, bairros da zona Leste como Mooca, Tatuapé, Jardim Anália Franco e Penha são  cobiçados por moradores das classes média e alta da região, atraindo projetos de incorporadoras. A Porte, por exemplo, concentra suas atividades no que chama de Eixo Platina – terrenos próximos às estações de metrô Belém, Tatuapé e Carrão, paralelos à Radial Leste – e concluiu, recentemente, no Tatuapé, o prédio mais alto de São Paulo. 

 

De janeiro a julho, o total de lançamentos na região Leste de São Paulo foi de 8.980 unidades, de acordo com o Secovi-SP. Pelo perfil da zona Leste, boa parte dos empreendimentos lançados se enquadra no segmento econômico. A avaliação de incorporadoras com focos nas rendas média e alta é que é mais difícil conseguir preços que tornem viável o desenvolvimento de projetos com essas características na região.

 

“As incorporadoras de capital aberto têm dificuldade de atuar fora do programa Casa Verde e Amarela na zona Leste. Tatuapé e Anália Franco têm bons preços, mas os valores caem depois desses bairros”, diz o vice-presidente de operações e diretor financeiro da Mitre Realty, Rodrigo Cagali. 

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